Placebo

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Artigo originalmente publicado na edição de 03/01/2015 do Jornal A Tarde.

O filme O Óleo de Lorenzo, conta a história real de um pai que trava uma busca incessante pela cura de uma raríssima doença degenerativa, a ALD, que começou a dar sinais em seu filho aos seis anos. O óleo, desenvolvido em 1988, baseado em azeite de oliva e colza, passou a levar o nome de Lorenzo e ajudou milhares de pessoas, além de render o título de Honoris Causa em Medicina ao pai e dar 20 anos de vida a Lorenzo além do que os médicos diziam.

Trinta anos depois pais brasileiros precisam burlar a lei para importar um remédio a base de maconha, o CBD, que reduz em 90% a ocorrência de convulsões em crianças com a rara desordem genética CDKL5. Anny Fisher, 5 anos, foi a primeira brasileira a conseguir na justiça o direito de importar legalmente o CBD. Reduziu de 80 convulsões por semana para 2 por mês. O CBD possui ainda diversas propriedades benéficas comprovadas no tratamento de esquizofrenia, parkinson, fobia social, transtorno do sono, diabetes tipo 2 e até mesmo na cura da dependência química de substâncias psicoativas. No Brasil, a lei prevê o cultivo e o uso da cannabis sativa para fins medicinais e científicos, mas na prática não há regulamentação nem regras claras para definir em que condições ela pode ser manipulada, o que impede que suas propriedades sejam exploradas e outras curas possam ser encontradas.

Nos Estados Unidos, o estado do Colorado legalizou a maconha em novembro de 2012, mas as primeiras lojas só abriram em 2014, tendo US$ 98 milhões arrecadados em impostos, que antes corriam pelo ralo do narcotráfico. As vendas totais de maconha de uso recreativo devem somar US$ 610 milhões e já terem empregaram direta ou indiretamente 100 mil pessoas. Desse dinheiro, US$ 45 milhões vão para programas de prevenção de uso na juventude e US$ 40 milhões para tratamento de abuso. Nos Estados Unidos já existem pelo menos cinco fundos americanos de venture capital colocando dinheiro em startups de maconha. Estudo recente mostrou que a legalização da maconha na França poderia render 2,2 bilhões de euros em tributos ao invés de gastar 568 milhões de euros por ano entre despesas judiciais, policiais e carcerárias atuais. Na Espanha, a pequena Rasquera de 900 habitantes, resolveu alugar seus terrenos para o cultivo da maconha e fugir da crise que assola o país.

Desde que os EUA decretaram a “Guerra as Drogas”, muitas cifras foram gastas em uma política internacional de repressão, que teve como resultado o crescimento de um mercado paralelo baseado em corrupção e violência, impedindo que as propriedades químicas da maconha pudessem ser exploradas pelas indústrias têxtil, farmacêutica, cosmética, entre tantas outras aplicações. Entender que o uso de substâncias psicoativas é um fenômeno natural da humanidade é o primeiro passo para mudar a forma como lidamos com a questão. E para isso é preciso responder com bons serviços de educação e saúde. Prender consumidores e os reunir com traficantes no mesmo local é a receita para universidades do crime, retrato das nossas penitenciárias. Uruguai, Holanda, Portugal e diversos estados norte-americanos se movem em direção ao futuro. Aqui, insistimos na mesma dose de um placebo caro, sonhando que ele faça efeito.

 

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